quarta-feira, 14 de julho de 2010

O signo ideológico





O signo é um dos conceitos que devem ser abordados em relação ao silêncio. Na visão de Bakhtin, linguista russo e um dos mais importantes autores do tema, o signo é toda mensagem que, não isolada do contexto social e do terreno ideológico, responde a um diálogo, é parte constitutiva de uma relação onde haja interação social (PONZIO, 2008). Portanto, todo signo carrega um conteúdo ideológico consigo ; o discurso do enunciador conterá segundas intenções, a palavra acaba por expressar idéias, pensamentos ou emoções do enunciador, mesmo que parcialmente. A ideologia, seja a “oficial” ou a “não oficial”, aparece assim no discurso do silêncio, nas entrelinhas, onde as palavras acabam por expressar mais do que o seu conceito singular.
Acreditamos que tanto o signo verbal quanto o não verbal têm importância na linguagem do indivíduo, se fazendo presente nos discursos e na comunicação de cada um. A idéia do signo ideológico de Bakhtin nos faz refletir sobre a questão do inconsciente e do silêncio no processo comunicativo a partir do momento em que o que é dito – e demonstrado – tem diversas significâncias, inúmeras raízes que muitas vezes não são percebidas, estão contidas no silêncio, e, portanto, na ideologia.
“Todo discurso é expressão não de um interior que se exterioriza, e sim de um exterior que se interioriza de forma especial [...]” (PONZIO, 2008, p. 84); o autor aborda então os conceitos de discurso “consciente” e discurso “inconsciente”, que, por mais que sejam diferentes, fazem parte da linguagem e consequentemente da ideologia. Seguindo essa linha de raciocínio, em O freudismo, Freud destaca o inconsciente como sendo parte da ideologia não oficial, ou seja, do discurso que a ideologia oficial censura, silencia. Ainda que os dois modos de consciência – oficial e não oficial – sejam discursos, a consciência oficial tem maior facilidade de se expressar através do discurso exterior, pois não sofre censura, além de subsistir como discurso interior, aquele que é revelado parcialmente através das entrelinhas e na ideologia, no silêncio.


Foto: Capa do livro Revolução Bakhtiniana, excelente para a pesquisa, de Augusto Ponzio, estudioso e especialista em Bakhtin.


quarta-feira, 21 de abril de 2010

ssshhh! Não vendemos produtos, vendemos felicidade!




"(...) o miraculoso do consumo serve (...) de sinais de felicidade" (BAUDRILLARD, 1995, pág. 22)




Quem nunca sentiu prazer ao adquirir certo produto/serviço? Até mesmo foi tomado de uma felicidade inexplicável, tudo causado pelo simples ato de compra? Através da Teoria Crítica - escola de Farnkfurt, - Adorno e Horkheimer foram os responsáveis pelo desenvolvimento do conceito de Indústria Cultural, na qual tudo que é cultura é tranformado em mercadoria, a produção cultural e intelectual passa a ser vista e guiada pelo consumo. Dessa forma, foi criada a idéia de que nós sempre nos realizaremos se comprarmos ou adquirirmos certo produto.


As produções televisivas e cinematográficas, por exemplo, sempre mostram personagens realizados e felizes porque têm algum tipo de objeto material. O que nós fazemos, então? A sociedade tende a imitar esses personagens, acreditando que alcançarão a felicidade que eles encontraram. A realização de cada um está condicionada a ter algo que se torna necessário (mesmo que não seja). Ter o celular mais avançado, o carro mais bonito, a roupa da moda, ir à festa mais comentada e esperada tornou-se sinônimo de felicidade. "Compre o nosso produto/serviço, e seja feliz [até lançarmos outra coisa mais desejada e moderna!]" Quem acaba comprando por acreditar que vai ter essa felicidade pode acabar não a encontrando, fato que só será superado ao consumir outra coisa, formando assim, o cliclo vicioso da sociedade de consumo.


Baudrillard mostra três exemplos que confundem os valores de consumo e felicidade: o kitsh, caracterizado pela reciclagem cultural (o que era antigo torna-se novo); o gadget, onde alguns produtos de utilidade prática passam a ter mais valor pelos seus acessórios e o lúdico, que representa a felicidade através da fuga da realidade. É a Publicidade que vai fazer com que o consumidor acredite que a realização está no consumo de objetos materiais, que os acessórios do produto são essenciais, que a felicidade na vida é fugir dela e que inúmeros objetos sem utilidade têm valor. Ela entra no incosciente de cada um e o seduz, fazendo-o acreditar na felicidade pelo consumo, e criando uma cultura industrial.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Sociedade de etiquetas



EU, ETIQUETA

Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos.
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.

Carlos Drummond de Andrade

Não poderia deixar de compartilhar esse poema (que eu adorei, por sinal), pois ele retrata bem a realidade em que estamos inseridos; as marcas fizeram da sociedade um "anúncio ambulante", a publicidade é quase como um feitiço na vida de cada um, criando necessidades que antes eram despercebidas ou nem existiam, mexem com as mentes e, de alguma maneira, deixam no nosso incosciente a sua mensagem, a idéia de comprar, comprar e comprar...

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Espiral do silêncio


Contagiante, não?

Política, economia, consumo, ecologia, moda... São muitos os assuntos que interessam a sociedade e que constituem bases para a formação da opinião pública. Os meios de comunicação de massa interferem ativamente na construção de pensamentos e opiniões, que acabam por "contaminar" um ao outro, quase como um "efeito manada" - o qual se refere à cópia de comportamento/ação entre as pessoas. Provocam, assim, a homogeneização das opiniões, ditam o que é certo e errado, pautando a vida dos indivíduos e dando a idéia de que é ela a responsável pela rotina de cada um (Teoria do agendamento/Agenda Setting).

Nesse mesmo contexto, a teoria da espiral do silêncio, pesquisa feita pela alemã Elisabeth Noelle-Neumann, é relacionada com o silenciamento das pessoas frente às pressões da sociedade e da mídia. As opiniões divergentes - que não agradam a maioria - tendem a ser silenciadas, os indivíduos optam por não expressar o que pensam em troca de serem "aceitos" e "incluídos" na sociedade. Por outro lado, a teoria da epiral do silêncio pode ser vista como controversa e polêmica, pois não se sabe se esse estudo se aplica a qualquer grupo, nem até que ponto as pessoas se calam para deixar de expressar a opinião. Com a suposta "liberdade de expressão", talvez essa realidade esteja mais distante.

Usando o mesmo raciocínio, a publicidade aparece como uma corrente que padroniza a sociedade, tenta convencer a cada um de que o produto/serviço exposto é a melhor opção, ditando a moda e causando, muitas vezes, a segregação social. Será que as pessoas usam e compram produtos de tal marca porque gostam mesmo? Ou elas se sentem excluídas quando não os usam? O silêncio que se encontra por trás da linguagem verbal e não-verbal dos anúncios e comerciais seduzem os receptores e silenciam a opinião. Só existe aquilo, e nada mais.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

O silêncio também comunica


O silêncio não é apenas "complemento de linguagem. Ele tem significância própria (...) o silêncio não está apenas "entre" as palavras. Ele as atravessa. Acontecimento essencial da significação, ele é matéria significante por excelência". (ORLANDI, 2002)


Ao contrário do que muitos pensam, o silêncio também comunica; ele aparece nas entrelinhas, construindo uma linguagem que por muitos passa despercebida. O discurso não é composto apenas por imagens, vocábulos e símbolos. Na época da ditadura, por exemplo, a presença do silêncio podia ser traduzida no medo que as pessoas sentiam de se expressar e de serem interpretadas; a censura aproximou aquele "cálice" à população, tão temido por todos.

No mundo da publicidade e da propaganda, o silêncio está sempre presente nos anúncios, seja no meio das palavras ou inserido nas imagens. De um modo mais discreto e implícito, as declarações não ditas e as formas não exibidas estão sempre atingindo o incosciente dos "alvos" de publicitários e propagandistas, persuadindo-os a ter certa idéia ou a comprar certo produto/serviço. O que será que está por trás desse fenômeno que adquire cada vez mais consumidores e adeptos? A sociedade do hiperconsumo está formada, e o silêncio continua a flutuar nas nossas mentes, passando informações e difundindo pensamentos. Afinal, o silêncio é arte, e também comunica...



texto: Renata Othon